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Infância conectada: saiba os riscos do contato precoce com o mundo digital

Jogos online e Inteligência Artificial transformam a rotina das crianças e adolescentes; pais devem ficar atentos aos impactos emocionais e sociais.

11/10/2025 às 12h07

A popularização dos jogos online e o avanço cada vez maior da inteligência artificial em diversos meios transformam o modo como as crianças e adolescentes se divertem e aprendem. Entretanto, apesar dos benefícios de seu uso, o contato precoce com o mundo digital também acende alertas sobre os impactos dessa nova realidade no desenvolvimento emocional, cognitivo e social da juventude atual.

No quarto de muitas casas, o brilho das telas já faz parte da rotina da maioria das crianças e adolescentes. Jogos como Roblox, Minecraft e Fortnite ocupam o tempo que, antes, era dedicado às brincadeiras ao ar livre e ao encontro presencial com amigos. Essa cena, cada vez mais comum, reflete uma mudança profunda na infância contemporânea, em que a diversão e o convívio passaram a acontecer, em grande parte, dentro de ambientes digitais.

Infância conectada: saiba os riscos do contato precoce com o mundo digital - (Reprodução/Arquivo Pessoal) Reprodução/Arquivo Pessoal
Infância conectada: saiba os riscos do contato precoce com o mundo digital

A infância mudou, e depressa, com jogos online e mundos virtuais se tornando os novos playgrounds de uma geração que já nasce conectada, mas também mais ansiosa, isolada e vulnerável. Com a chegada da inteligência artificial em aplicativos e plataformas, por exemplo, as fronteiras entre o real e o virtual se tornaram ainda mais indistintas. O que antes era apenas diversão, agora levanta sérias preocupações sobre saúde mental, segurança e desenvolvimento infantil.

O psicólogo Rodrigo Lopes observa o fenômeno com apreensão e explica que o impacto do uso precoce e excessivo das telas pode ser agressivo, principalmente para crianças e adolescentes, fase em que estão em fase de formação. Segundo o profissional, que também é neurocientista, a exposição prolongada pode alterar não só o comportamento, mas também a percepção de realidade.

“A criança começa a buscar prazer o tempo todo, o que chamamos de comportamento dopaminérgico. Ela vive em busca do estímulo rápido, da recompensa imediata. Isso compromete o autocontrole, a atenção e até a autoestima”, explica o especialista.

Rodrigo ressalta que, quanto mais cedo a criança tem contato com telas, mais difícil é estabelecer limites posteriormente. “Tem pai ou mãe que entrega o celular para o filho com nove meses, o que é um erro. Pode gerar problemas psicológicos e até mesmo oftalmológicos. O ideal é retardar ao máximo o uso e, quando for inevitável, supervisionar sempre”, afirma.

O psicólogo defende que as famílias retomem o espaço da convivência real, o contato físico e emocional, algo que a tecnologia não pode substituir ou proporcionar. “A IA não veio para ocupar o lugar de ninguém. A criança precisa do olhar, do toque, da presença dos pais. Isso é insubstituível”, reforça Lopes.

Mas o alerta de especialistas não é voltado apenas para o âmbito emocional e psicológico. Há, também, o risco de exposição a pessoas mal-intencionadas, manipulações e abusos virtuais. “É preciso supervisionar o que as crianças fazem, com quem conversam. O ideal é que os pais criem contas compartilhadas e usem aplicativos com controle familiar. A internet é uma avenida sem sinalização e a criança não sabe se proteger sozinha”, alerta o profissional.

Vida conectada

Nas famílias, a tecnologia já virou tema de negociação. Glaydstone Alves, pai de Ana Luisa, de 8 anos, e Ana Laura, de 3, tenta equilibrar o uso das telas com a rotina da casa e da família. “Nós tentamos adiar o contato, mas acabou acontecendo, por volta dos dois anos”, conta ele.

Com o tempo, veio a necessidade de impor limites no uso das telas. “Quando o tempo de uso passa do combinado, geralmente duas horas por turno, percebo agitação, dificuldade para dormir. No começo, quando estipulamos tempo para uso das telas, houve irritabilidade, agitação e uma certa dificuldade de trocar a tela por brincadeiras mais lúdicas”, diz.

O pai das duas crianças diz que o maior segredo para o controle está nas regras impostas. “Nada de telas nas refeições e antes de dormir. No estudo é permitido apenas para consulta quando não esteja explícito no material escolar. Incentivamos brincadeiras, leituras e conversas no lugar do celular. E, principalmente, procuramos dar o exemplo como pais”, destaca Glaydstone.

Infância conectada: saiba os riscos do contato precoce com o mundo digital - (Reprodução/Arquivo Pessoal) Reprodução/Arquivo Pessoal
Infância conectada: saiba os riscos do contato precoce com o mundo digital

O pai de Ana Luisa e Ana Laura ainda diz acreditar que os jogos e os conteúdos digitais têm influência na forma como os filhos percebem o mundo. “A geração atual enxerga o mundo tecnológico de forma muito diferente da dos pais — têm mais facilidade com o uso de dispositivos e acesso rápido à informação. É fundamental que as crianças compreendam claramente essa diferença entre o mundo real e o virtual”, reforça ele.

Para Esaú Furtado, pai do pequeno Bento, de 5 anos, controlar o tempo de tela virou uma tarefa diária. “Ele começou a ter contato com 3 anos, então sempre teve contato com a tecnologia, até porque é inevitável nos dias de hoje. Mas notamos que ele está criando um vício por jogos on-line”, afirma. Segundo ele, a criança fica muito eufórica e ansiosa após passar muito tempo no ambiente virtual, e sempre está comentando sobre os jogos.

Esaú afirma que, durante a semana, o acesso às telas é proibido. “Ele só tem o final de semana para jogar. Durante a semana, brinca normalmente como outras crianças”. Mesmo assim, o pai de Bento admite que o uso das telas acaba atrapalhando a rotina da casa, pois tira a concentração nos momentos de convivência da família. “Pela idade, ele fantasia muito por conta dos jogos, mas nada que atrapalhe o desenvolvimento dele”, conclui.

O perigo invisível

Para Rodrigo Lopes, a confusão dos limites entre fantasia e realidade acendem um sinal de alerta, principalmente com a expansão da inteligência artificial. “A IA pode ser uma ferramenta, mas jamais deve substituir o acompanhamento profissional. E, principalmente, nunca deve ser usada por crianças sem supervisão. Os pais precisam estar por perto, atentos a mudanças de comportamento, ao que a criança está consumindo e ao que ela sente”, orienta o psicólogo.

Rodrigo Lopes, psicólogo - (Assis Fernandes/O DIA) Assis Fernandes/O DIA
Rodrigo Lopes, psicólogo

O especialista recomenda que o uso de tecnologias e redes sociais só comece, de fato, após os 12 anos, e sempre com o tempo limitado. Antes disso, o ideal é priorizar o aprendizado físico, o contato com a natureza e as brincadeiras fora das telas. “A criança precisa correr, dançar, brincar. O corpo foi feito para se movimentar, e o cérebro infantil precisa de experiências reais para se desenvolver de forma saudável”, explica.

Outro perigo colateral do uso excessivo de telas é uma possível confusão de sintomas. Rodrigo Lopes esclarece que muitas crianças chegam a consultórios com diagnósticos, por exemplo, de TDAH, ansiedade ou até autismo, quando na verdade o comportamento é apenas uma resposta ao tempo excessivo diante das telas. “A criança que fica muito tempo conectada pode ter insônia, hiperatividade, falta de atenção, irritabilidade. São sintomas que se parecem com transtornos, mas que desaparecem quando o uso é controlado”.

A tecnologia, inevitável e fascinante, é também um desafio. Exige diálogo, paciência e, acima de tudo, acompanhamento constante. “Os pais precisam ser o filtro emocional dos filhos. Não adianta só proibir, é preciso explicar, participar, estar junto. Transformar a tecnologia em uma aliada, e não em um substituto da vida real”, conclui Rodrigo Lopes.


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Com edição de Isabela Lopes.