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A PRÓXIMA CRISE NÃO SERÁ COMO A DE ‘29

Quando o mercado começou a dar sinais de esgotamento e os preços das ações tiveram uma baixa, desencadeou-se o pânico.

10/12/2025 às 17h53

A ameaça de uma crise econômica de proporções históricas paira sobre o mercado de capitais norte-americano. No entanto, a próxima grande crise, embora potencialmente catastrófica em sua magnitude, não será uma repetição exata da Grande Depressão de 1929

O colapso financeiro deflacionário de 1929, que deu origem à “Grande Depressão”, iniciou- se com a quebra da Bolsa de Valores de Nova York, a partir da "Quinta-Feira Negra" (24/10/1929), depois de anos de especulação financeira alimentada pela venda de ações on margin, operação em que o público adquiria ações das empresas mais promissoras, que estavam em alta, mediante a obtenção de empréstimos de até 90% do valor da compra, dando as próprias ações em garantia.

Quando o mercado começou a dar sinais de esgotamento e os preços das ações tiveram uma baixa, desencadeou-se o pânico, pois a perda de valor das ações reduzia a garantia dos empréstimos, forçando a liquidação dos mesmos, o que exigia a venda das ações, movimento que reforçava o viés de queda da cotação das mesmas, comprometendo ainda mais as garantias oferecidas, criando-se assim o “círculo vicioso” que resultou em uma queda monumental do índice Dow-Jones, de cerca de 89%, até 1932, numa enorme destruição de riqueza.

A inadimplência em massa dos empréstimos contraídos para a compra de ações, cuja garantia havia se perdido, comprometia a solidez do sistema bancário, provocando uma corrida aos bancos, o que levou ao colapso imediato de milhares de bancos (mais de quatro mil faliram). A falta de regulamentação bancária e a escassez de liquidez agravaram a situação. Na época, diferentemente da crise de 2008, vigorava o “padrão ouro”, que vinculava a base monetária (o volume de dólares em circulação) às reservas de ouro depositadas no FED, o banco central dos EUA, o que impedia que o FED emitisse moedas na quantidade necessária para estancar a crise de liquidez.

A quebra dos bancos e a desconfiança generalizada reduziram drasticamente o crédito, freando o consumo, o que obrigou o setor produtivo a diminuir a produção industrial e a demitir funcionários, agravando ainda mais a crise.

O colapso gerou uma década de miséria, com consequências sociais e econômicas devastadoras. O desemprego disparou de 4% para aproximadamente 27% da força de trabalho dos EUA; o salário médio na indústria, o PIB nominal e a produção industrial dos Estados Unidos caíram para a metade. A retração das importações dos EUA, em razão da queda no consumo, fez com que a crise se espalhasse pelo mundo. Países dependentes de exportações (como o Brasil, com o café) foram severamente afetados.

A origem da crise de 1929 foi a especulação no mercado de ações, mas a chave que abriu a porta para a contaminação de toda a economia foi a incapacidade do banco central, o FED, de agir como emprestador de última instância (devido às restrições do Padrão Ouro), o que permitiu que o crash da bolsa se transformasse em uma depressão econômica profunda e prolongada.

O sistema econômico contemporâneo carrega vulnerabilidades estruturais que remetem perigosamente à década de 1920, tais como a “Alavancagem Sistêmica”, que se manifesta não apenas na compra de ações "on margin" (como em 1929), mas no endividamento corporativo maciço, representado por dívidas que as empresas contraem não para investimentos produtivos, mas frequentemente para recomprar suas próprias ações (stock buybacks), inflando artificialmente os preços das mesmas e criando um otimismo artificial no mercado.

Assim como na década de 20 do século passado, o otimismo do mercado está perigosamente concentrado em um punhado de empresas. No século passado eram a General Motors (GM), a General Electric (GE), e empresas de rádio e comunicação, como a RCA. Atualmente são as gigantes da tecnologia, as "Sete Magníficas": Apple, Microsoft, Alphabet, Amazon, Meta, Nvidia e Tesla. A valorização dessas poucas empresas impulsiona índices inteiros de maneira desproporcional, replicando o cenário de 1929, onde o colapso de poucas ações líderes causou o contágio generalizado. Esta concentração desvincula a avaliação do mercado da realidade econômica ampla.

Outrossim, atualmente, a desigualdade de renda atingiu níveis recordes nos EUA, comparáveis aos de 1929. A renda estagnada e o endividamento crescente do consumidor médio minam a base de consumo da economia. Essa crise de subconsumo gera excedente na produção e consequente queda de lucros, que é um gatilho clássico para recessões profundas.

No entanto, apesar das semelhanças estruturais entre a crise de 1929 e aquela que hoje se anuncia, a atual arquitetura institucional de resposta à crise impede o desfecho deflacionário de 1929. O FED não está mais limitado pelo Padrão Ouro, que reduziu a capacidade de intervenção

em 1929. Hoje, o FED possui a capacidade ilimitada de injetar liquidez no sistema através da criação de moeda, evitando o colapso deflacionário e a quebra em cascata de bancos, que no passado foi causada pela escassez de liquidez, mas, em contrapartida, a injeção contínua de liquidez provoca a desvalorização da moeda (inflação/hiperinflação), transformando a crise de liquidez em uma crise de valor monetário.

Na perspectiva da nova crise, os investidores têm procurado ativos reais, tangíveis ou financeiros, como o ouro, e ativos não-financeiros (não sujeitos às agências reguladoras) como as criptomoedas, provocando um boom no preço de tais ativos, o que é interpretado como uma fuga universal da moeda, em busca de proteção em ativos escassos, visando escapar da perda de poder de compra da moeda, em um fenômeno que se assemelha mais à Hiperinflação de Weimar, verificada na Alemanha de 1923, do que à deflação de 1929, nos EUA.

Assim, há indícios preocupantes de uma nova crise na bolsa de valores norte-america, mas a possibilidade de a nova crise produzir efeitos comparáveis ao colapso deflacionário visto em 1929 é baixa. A nova crise seria contida pela intervenção do FED, que evitaria uma crise aguda como a depressão econômica do século passado, embora a mesma possa se converter em uma crise monetária sistêmica crônica.

Diante da iminente crise no mercado mobiliário, o FED está preso em um impasse. Se aumenta os juros, corre o risco de provocar o colapso da bolsa, devido à necessidade de as empresas venderem suas ações para pagarem suas dívidas junto aos bancos, derrubando a valorização das ações e provocando um efeito cascata; se aumenta a liquidez, baixando os juros e ampliando a base monetária (imprimindo moeda), salva o mercado financeiro, mas agrava o quadro inflacionário já estressado pela tarifas comerciais impostas pela atual política externa norte-americana, prejudicando a credibilidade do FED e comprometendo o poder de compra da moeda.

O cenário mais provável é a sucessão de ciclos de estresse do mercado, seguido pela intervenção obrigatória do FED, com injeção de liquidez, que impede o crash total, mas perpetua a crise de valor da moeda.


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