Comemorado no dia 26 de julho, o Dia dos Avós é uma data que vai além das lembranças afetivas da infância: é uma celebração do cuidado, da sabedoria e da presença constante dessas figuras tão especiais na vida familiar. Em muitos lares brasileiros, os avós ocupam um papel fundamental na criação dos netos, seja como suporte afetivo, apoio prático ou referência de valores. Mais do que mimar, eles acolhem, ensinam, escutam e, acima de tudo, amam com a tranquilidade de quem já viveu muito e aprendeu a valorizar o tempo ao lado de quem se ama.
A escolha da data está relacionada à tradição católica, que celebra Santa Ana e São Joaquim, pais de Maria e, portanto, avós de Jesus. Mas independentemente da crença, a data nos convida a refletir sobre o papel transformador dos avós na formação das novas gerações.
A vida do casal Rita Ferreira Campos (62) e Wagner Campos (60) ganhou um novo significado com a chegada do pequeno Isaac Oliveira Campos (05). Diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA) aos dois anos, Isaac é hoje o centro da rotina e do afeto de uma família com muito amor, companheirismo e força para aprender e ensinar.
“Até os dois anos, ele era uma criança que só brincava, mas depois do diagnóstico passamos a seguir uma rotina, e ele já sabe o que precisa fazer”, conta a avó Rita, pedagoga aposentada. Ela reconhece que, apesar dos desafios, cuidar do neto tem sido uma oportunidade de enxergar a infância com outros olhos: mais atentos, pacientes e amorosos.
E a rotina mudou. Na casa, que antes morava apenas Rita, Wagner e a filha do casal, Milena, passou a ser palco de descobertas, brincadeiras, deveres e aprendizados.
Todo dia é uma surpresa. Às vezes, achamos que estamos ensinando, mas estamos aprendendo. Quando o Isaac faz alguma coisa, temos que reavaliar e reaprender, e isso é bom para nós também
Wagner Campos é o avô parceiro de aventuras ao lado de Isaac. Por trabalhar à noite, ele aproveita a presença do neto durante o dia para participar ativamente das brincadeiras e também das atividades diárias relacionadas à terapia. “Conforme as terapias, aprendemos que tem a hora de brincar, de estudar, de ensinar. E tudo o que for para melhorar a vida do Isaac é bem-vindo”, diz.
Entre os dois, a conexão é evidente. No colo do avô, Isaac comenta que “gosto de brincar, jogar, andar de bicicleta com meu avô, conversar, passear. Ele me ensina a jogar bola, e eu gosto muito quando estamos nós dois”, conta o menino.
Para os avós, a experiência com o neto também resgata um tempo que foi perdido com os filhos, quando pequenos e que, agora, conseguem retribuir para o neto. “Quando casamos e tivemos nossos filhos, não fomos pais tão presentes, porque precisávamos trabalhar muito. Com o neto, meio que voltamos a ser pais, mas com mais tempo, mais calma e mais afeto”, compartilha Wagner.
Essa relação se estende a um verdadeiro “quarteto de avós”, como define Rita, que compartilha o cuidado com os avós maternos de Isaac. “Nunca tivemos embates. Sempre conversamos sobre o que é melhor para ele. E isso também é mérito dos pais do Isaac, que nos incluem em todas as decisões”, relatava a avó.
O envolvimento não se resume a cuidados práticos, como alimentar e educar, inclui, ainda, o afeto. Segundo Rita, “não somos só cuidadores. Meu filho e minha nora querem que estejamos presentes, que participemos. Ser avós é uma oportunidade de sermos melhores do que fomos como pais. Não somos perfeitos, mas todos os dias temos a chance de melhorar”, enfatiza Rita.
A missão de ser pai-avô “Eles foram um fator de renovação de vida”
Aos 73 anos, o professor aposentado Luis Soares de Araújo Filho carrega no coração a experiência transformadora de ser, ao mesmo tempo, avô e pai. Após sofrer um infarto aos 49 anos, jamais imaginava que teria o privilégio de acompanhar de perto a criação dos netos. Mas a vida lhe presenteou com muito mais do que isso: ele e a esposa acolheram e criaram dois deles, Luis Emanuel e Maria Eduarda Barreto Araújo, com quem compartilham o cotidiano, os aprendizados e o amor.
Luis Emanuel, hoje com 23 anos e está cursando o nono período de Medicina, foi morar com os avós aos três anos e meio. Maria Eduarda (16) tinha apenas um mês de vida quando a casa dos avós também tornou-se seu lar. O casal assumiu um papel que vai além dos mimos característicos dos avós, eles tinham a missão de educar, orientar e acompanhar cada passo dos netos.
Para o professor, a guarda judicial é apenas um detalhe; o vínculo construído no dia a dia é o que mais importa e fortalece a relação. E, apesar da responsabilidade que essa importante missão exige, Luis Soares nunca sentiu que houvesse competição ou atrito com os pais das crianças. Pelo contrário, a rotina sempre foi compartilhada, como a rotina escolar, no qual os pais levam os filhos à escola pela manhã, e o avô busca no final do dia.
A convivência com os netos trouxe mais do que uma ocupação, também renovou seu sentido de viver.
Eles foram a melhor coisa que aconteceu na minha vida. Tenho um quadro de saúde relativamente crítico e eles foram um fator de renovação de vida
Além dos dois que criou, Luis Soares é avô de outros três netos, com quem mantém uma relação próxima e afetuosa. Ele reconhece as diferenças entre ser avô tradicional - aquele que não impõe regras e aproveita os momentos leves - e ser pai-avô, função que exige firmeza e constância.
“Como pai-avó, é uma alegria muito grande vê-los caminhar com as próprias pernas e conquistarem seus próprios espaços e futuros profissionais. É importante dar essa assistência e acompanhá-los nessas novas conquistas. E aos que são netos, somos espectadores, torcendo para que eles consigam galgar seus objetivos”, conclui o professor aposentado.
Avós e netos: uma relação que transforma vidas
A convivência entre avós e netos é, muitas vezes, uma das experiências mais profundas e enriquecedoras que a vida em família pode proporcionar. Mais do que só mimos e brincadeiras, essa relação é uma base que atravessa gerações e ajuda na construção emocional das crianças.
A psicóloga Cinthya Selma Soares destaca que “a presença dos avós na vida dos netos geralmente é um dos vínculos mais ricos e afetivos que podemos cultivar ao longo da vida”. Nos lares brasileiro, onde a família costuma dividir responsabilidades, os avós vão além do papel simbólico: atuam como cuidadores, conselheiros e referências afetivas.
Segundo a especialista, esse vínculo oferece segurança, acolhimento e escuta, elementos fundamentais para o desenvolvimento saudável da criança.
Existe até um ditado popular que diz: ‘Avós são pais com açúcar’. Quando vêm os netos, eles já não carregam o mesmo peso das obrigações diárias e isso abre caminho para um vínculo mais leve, mais afetivo, com menos cobrança e mais presença emocional
E essa troca não é valiosa apenas para os pequenos. Os avós também se beneficiam com esse convívio, ao redescobrir o sentido da vida e reviver momentos da parentalidade com mais calma, dando uma nova motivação. Segundo Cinthya, “essa ‘doação afetiva’ não é só boa para os netos, que se beneficiam desse carinho e sabedoria, mas também para os próprios avós, que encontram nesse papel uma fonte de alegria, reconexão e propósito”, ressalta.
Contudo, é sabido que nem todas as famílias brasileiras conseguem vivenciar essa experiência, pois há histórias marcadas por conflitos, distanciamentos e dificuldades emocionais que impedem o estreitamento desses laços. Por isso, é importante não romantizar esse tipo de vivência, já que há avós que não conseguem exercer esse papel por limitações emocionais, de saúde ou até mesmo pela distância física.
“Do ponto de vista psicológico, é importante reconhecer que cada família tem sua história, suas limitações e suas possibilidades. Nem todo avô ou avó conseguirá exercer esse papel acolhedor e afetivo e isso pode gerar frustrações tanto nos filhos quanto nos netos”, destaca Cinthya Araújo.
Por outro lado, quando há espaço para o vínculo e ele é cultivado com carinho e respeito, o resultado é transformador. Avós e netos se fortalecem mutuamente, compartilham experiências e aprendizados, criam histórias que moldam não só a infância, mas toda a trajetória de vida.
“O mais importante é que, onde houver espaço para vínculo, carinho e presença, seja com avós, tios, vizinhos ou outras figuras de cuidado, essas conexões possam ser cultivadas e valorizadas. Porque o que realmente faz diferença na formação emocional de uma criança é ter alguém com quem ela possa contar, alguém que ofereça amor, segurança e acolhimento”, conclui a psicóloga.
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