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Direito de família: as consequências jurídicas dos novos arranjos familiares

Especialista explica como diferentes padrões de convivência marital podem ser entendidos e como influenciam o cenário judicial.

27/08/2025 às 08h36

27/08/2025 às 08h36

Casamento, união estável, divórcio, filiação, guarda de filhos e pensão alimentícia são temas que atravessam a vida de milhares de famílias brasileira. Todas essas relações, simultaneamente pessoais e patrimoniais, são regulamentadas pelo Direito de Família, área que guia também a sucessão hereditária, os direitos previdenciários e a proteção do chamado bem de família.

De 2015 a 2019, o número de casamentos no Brasil caiu 10,26%, de 1.131.707 para 1.015.620. Já o de uniões estáveis aumentou de 2006 a 2019, subindo de 31.586 para 146.779 (364,9%). O Censo 2010 do IBGE mostra que 36,4% dos casais do país estavam em regime de união estável. Diante das constantes transformações sociais, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem sido protagonista na interpretação das normas, influenciadas pelos novos arranjos familiares.

A advogada Raquel Galvão, especialista em Direito das Famílias, Sucessões e Planejamento Sucessório, afirma que as evoluções jurídicas são constantes, motivadas pelas mudanças da sociedade. Segundo ela, muitos mitos circulam sobre o tema, especialmente quando se trata das responsabilidades e obrigações em relacionamentos que envolvem dependentes, como crianças e adolescentes.

Raquel esclarece que o STJ tem consolidado cada vez mais o entendimento de que vínculos socioafetivos (quando um padrasto ou madrasta assume o papel de pai ou mãe, seja oficialmente ou não) podem gerar direitos e deveres semelhantes aos da filiação biológica. “Se houver comprovação de afeto e dependência, esse vínculo pode ser reconhecido até em cartório, desde que haja acordo entre os pais biológicos e a criança tenha mais de 12 anos”, diz. A jurista ressalta que a configuração traz consequências sucessórias e obrigações de custeio, como pagamento de pensão.

Direito de família: as consequências jurídicas dos novos arranjos familiares. - (Assis Fernandes/ O DIA) Assis Fernandes/ O DIA
Direito de família: as consequências jurídicas dos novos arranjos familiares.

Mas é preciso lembrar que esse reconhecimento de afiliação, em casos socioafetivos, não é automático. De acordo com Raquel Galvão, é preciso provar a relação de afetividade e dependência econômica através de documentos como laudos psicológicos, fotografias, testemunhas da escola [da criança ou adolescente] e relatórios médicos, atestando que o padrasto ou madrasta realmente assume o papel de pai ou mãe.

União estável e regime de bens

Outra configuração importante que pode causar alterações nas normas judiciais é a união estável, que embora não formalizada como casamento gera os mesmos efeitos patrimoniais. “A relação precisa ser pública, contínua, duradoura e com intenção de construir família. Não é necessário morar junto, mas sinais como despedir despesas e ser dependente em plano de saúde ou cartão de crédito podem caracterizar união estável”, destaca Raquel Galvão.

Quando a relação chega ao fim, os bens adquiridos ao longo do relacionamento e da convivência são partilhados, assim como com o casamento oficializado. “Mesmo que um bem tenha sido comprado apenas por um dos parceiros, presume-se o esforço comum. Por isso, é fundamental registrar em cartório contratos de convivência e definir o regime de bens, para evitar conflitos futuros”, ressalta a advogada.

Pensão alimentícia e responsabilidade dos pais

A pensão alimentícia também é um tópico bastante discutido, que gera dúvidas e, frequentemente, conflitos familiares. A especialista esclarece que não há uma fórmula física, como a de 30% do salário ter que ser voltado para o pagamento, como muitos acreditam. O cálculo da pensão segue o chamado trinômio, que equilibra a necessidade de quem recebe, a possibilidade de quem paga e a proporcionalidade entre os genitores.

“A denominação ‘alimentícia’ não envolve apenas alimentos, mas moradia, transporte, lazer, saúde, educação, internet e até serviços de streaming que a criança usufrui. Tudo deve ser dividido conforme a capacidade econômica dos pais”, explica Raquel Galvão. A advogada lembra ainda que a falta de pagamento pode levar a tomada de medidas severas, como penhora de bens ou até prisão civil do devedor. “Alimentos não são favor, são direitos da criança”, frisa.

O cuidado invisível e a importância da formalização

Raquel Galvão faz um alerta sobre o chamado trabalho invisível de cuidado, que geralmente é assumido por mulheres. “Quem cuida mais, gasta mais tempo e energia, que poderiam ser dedicados ao mercado de trabalho. Esse aspecto também deve ser considerado na divisão das responsabilidades financeiras”, afirma.

A especialista em direito familiar reforça ainda a importância de formalizar relações e acordos em cartórios, tornando acordos reconhecidos pela lei. “Muitos casais evitam conversas que podem ser difíceis, sobre bens e responsabilidade. Mas são justamente essas definições que previnem problemas no futuro”, diz. Além disso, Raquel ressalta que a documentação também pode garantir os direitos do casal e do(s) filho(s) e a segurança jurídica e evitar litígios.

Rebeca Negreiros, especial para o Portal O Dia, com edição de Isabela Lopes.


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