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Para os íntimos, P. II: a praça que é coração histórico e cultural de Teresina

Esse espaço reúne memórias, cultura e desafios urbanos ao longo de mais de 170 anos.

06/09/2025 às 17h53

No centro de Teresina, rodeada por edifícios que narram a formação e as transformações da cidade, a Praça Pedro II resiste como um dos símbolos mais fortes da identidade piauiense. Fundado ainda no início do século XX, pouco tempo após a transferência da capital de Oeiras para as margens do Rio Parnaíba, o local foi primeiro batizado de Praça João Pessoa e teve outros nomes, como Independência e Aquidabã, até que, em 1936, finalmente recebeu a nomenclatura que tem hoje.

Ao longo dos anos, o espaço se consolidou como ponto de partida para a organização da nova cidade planejada. A construção do Teatro 4 de Setembro em 1894, do Clube dos Diários em 1927 e do Cine Rex em 1939 reforçaram cada vez mais a capacidade da Praça de ser um centro artístico e cultural. Em 1936, a área passou por uma grande e importante reforma, com construções baseadas no estilo Art Deco, projeto paisagístico e montagens arquitetônicas e mobiliárias que a marcaram como foco de lazer e convivência teresinense.

Mais do que um cartão-postal, a praça é palco de vida social, política e cultural da capital há mais de 170 anos e sua história se confunde com a da própria cidade. Em seu entorno, foram erguidos alguns dos prédios mais emblemáticos da capital, como o Palácio de Karnak, atual sede do governo estadual, a Igreja Nossa Senhora do Amparo, primeira matriz de Teresina, a Central de Artesanato Mestre Dezinho e o prédio que hoje abriga o Museu do Piauí. Essa concentração de instituições políticas, religiosas e de cultura conferiu à praça um papel central desde a fundação de Teresina.

Praça Pedro II, século XX. - (Acervo/Biblioteca IBGE) Acervo/Biblioteca IBGE
Praça Pedro II, século XX.

O historiador Ricardo Arraes, professor, estudioso e pesquisador de Teresina, afirma que a própria formação da praça revela como a capital foi se construindo. Ele explica que, no rascunho elaborado por Mestre Isidoro França, a pedido de Saraiva (então presidente da Província do Piauí), havia espaços em branco dentro da cidade, e um deles corresponde ao que se tornaria a P. II. “Ela foi ganhando vida no encontro das pessoas, no espaço diante da igreja, do teatro. Tornou-se um ponto de efervescência cultural e social da capital”, destaca.

Palco social e arquitetônico

Durante décadas, a praça cumpriu um papel central como espaço de sociabilidade. Nos domingos de missa, reunia pessoas de diferentes classes sociais e econômicas que, após a celebração, permaneciam ali em conversas e encontros. Mais tarde, o local transformou-se em palco de grandes acontecimentos políticos e manifestações sociais. Para o historiador, aquele espaço já foi o centro de efervescência da capital, onde eram realizados importantes comícios e chegavam até mesmo pessoas de outros estados para discursar, por ser um ponto de encontro da população da capital.

A vitalidade do espaço também se manifestava na cultura. O Theatro 4 de Setembro, que nesta semana celebra 131 anos de história, foi responsável por receber espetáculos e conferências de relevância nacional. A inauguração do Cine Rex, na década de 1930, ampliou a vocação cultural da área, tornando a Praça Pedro II ainda mais movimentada.

Ao longo dos anos, a praça passou por diversas mudanças arquitetônicas. Ricardo Arraes diz que a área já chegou a abrigar um lago com garças, que conferia frescor e beleza ao local. Hoje, mantém o coreto, jardins, bancos e algumas ruas que atravessam seu espaço, como a Avenida Antonino Freire, conhecida como a “menor avenida do mundo”.

A Praça Pedro II também é cercada por construções que contam a história da cidade. O antigo Quartel da Força Pública hoje abriga o Centro de Artesanato Mestre Dezinho. Já o Cine Rex, que foi moderno para sua época, encontra-se em estado avançado de deterioração. Professor Arraes lembra que essa diversidade arquitetônica é reflexo das mudanças urbanas pelas quais o centro passou, mas alerta que a falta de preservação ameaça a memória da cidade.

Praça Pedro II atualmente. - (Assis Fernandes/O DIA) Assis Fernandes/O DIA
Praça Pedro II atualmente.

Desafios atuais e a perda do passado

Apesar de sua grande relevância histórica, a Praça Pedro II vem perdendo cada vez mais a centralidade que teve no passado, principalmente nas últimas seis décadas do século XX. O crescimento desordenado da cidade e a valorização de outras regiões, como as zonas leste e sul, reduziram o fluxo de pessoas que frequentam o centro histórico. Para muitos moradores, a praça deixou de ser espaço de lazer e passou a ser marcada pelo abandono, crime e insegurança.

Ricardo Arraes avalia que o valor simbólico da praça é apoiado, sobretudo, nos moradores mais antigos da região, que ainda guardam lembranças de momentos como os domingos e tardes animadas no espaço. O historiador destaca que, nas décadas de 1940, 1950 e 1960, o local fervilhava, mas que a partir da década de 1970, entrou em declínio como ponto de encontro da sociedade. Atualmente, segundo o pesquisador afirma que o espaço é visto como um espaço insalubre e insegura, o que afasta a população, especialmente no período da noite.

Eventos culturais seria um recomeço plausível

Apesar das várias dificuldades que a praça vem enfrentando nas últimas décadas, Ricardo Arraes acredita que é sim possível resgatar o protagonismo do local. Ele defende que a promoção de eventos, especialmente no período noturno, seria uma forma de atrair novamente a população piauiense, já que o clima mais ameno à noite favorece atividades nesse horário. O investimento e divulgação de peças de teatro, shows e feiras poderia devolver a vitalidade ao espaço.

Todavia, o professor ressalta que essa estratégia não pode ser implementada sem a presença firme e a garantia do Estado. A população precisa sentir--se segura para circular pela P. II, o que hoje não acontece. “Sem segurança, não há futuro possível de retorno da população. É preciso que o Estado garanta condições para que a Praça Pedro II volte a ser um centro de reunião da sociedade, bonita, salubre e representativa como foi tempos atrás”, diz.

Prof. Ricardo Arraes, historiador. - (Assis Fernandes/O DIA) Assis Fernandes/O DIA
Prof. Ricardo Arraes, historiador.

Mesmo com a gradual perda da movimentação e da relevância na sociedade teresinense atual, a praça continua sendo não só um ponto geográfico, mas também um símbolo afetivo para muitos moradores da capital. Festas religiosas, espetáculos no Theatro 4 de Setembro, passeios em família e encontros casuais compõem o imaginário de gerações que viveram momentos marcantes naquele espaço.

Ainda com a perda de vitalidade, a praça continua sendo referência na paisagem urbana e na identidade cultural da capital. Há mais de 170 anos, a P.II, como chamam os teresinenses que têm um relacionamento mais “íntimo” com o local, segue como testemunha da história da cidade. Revitalizar e preservar a Praça Pedro II significa mais que conservar prédios e jardins, é resguardar a memória coletiva de gerações e garantir que o coração histórico da cidade continue vivo no presente e no futuro.

Rebeca Negreiros, especial para o Portal O Dia, com edição de Isabela Lopes.


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