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Outubro Rosa: cuidado com a mente também é parte da prevenção

A campanha Outubro Rosa, tradicionalmente voltada à prevenção e ao diagnóstico precoce do câncer de mama, tem ganhado um novo tom, que chama atenção para a saúde emocional. Afinal, como lembram especialistas, corpo e mente caminham juntos, e mulheres emocionalmente esgotadas tendem a ter maior aversão a consultas, ignorar sintomas e deixar o próprio bem-estar em segundo plano.

Em entrevista ao Sistema O Dia, a psicóloga Kalina Galvão, que atua com projetos de acolhimento para mulheres, explica que o tema precisa ser entendido dentro de um conceito maior, o da “economia do cuidado”. Este termo, ainda pouco conhecido, se refere à sobrecarga invisível que recai sobre as mulheres, responsáveis não só pelo trabalho profissional, mas também pelas tarefas domésticas, pelo cuidado com filhos, idosos e familiares.

“O Outubro Rosa não é só o mês de prevenção física, é também um alerta para a sobrecarga emocional das mulheres”, diz Kalina. “A economia do cuidado é perceber onde essa mulher está se sobrecarregando, porque isso também adoece. Se ela não souber distribuir o tempo e as tarefas, vai acumulando funções e acabará adoecendo mentalmente”.

Outubro Rosa: cuidado com a mente também é parte da prevenção

A psicóloga observa que, em muitos casos, o problema não está apenas na rotina intensa, mas também no sentimento de culpa que acompanha o ato de cuidar de si. “É muito comum ouvir no consultório ‘acho egoísmo tirar um tempo para mim’. Isso é cultural, a mulher foi ensinada a provar que dá conta, que pode fazer tudo. Quando precisa parar, acha que vai ser julgada, que está falhando”, explica Kalina.

Essa culpa se manifesta nas pequenas coisas e até em momentos de descanso. “Às vezes, fazer a unha ou sair para caminhar é visto como perda de tempo, mas são gestos de autocuidado. São pausas necessárias para recarregar as energias e manter a saúde emocional em equilíbrio”, afirma a profissional.

A psicólogo alerta ainda para a chamada “modo automático”, um estado em que a mulher age movida por obrigações e não por consciência. “Ela nem precisa ser cobrada. Já se antecipa, já se culpa. É um padrão herdado de gerações anteriores, quando a mulher era vista como submissa e responsável pelo bem-estar de todos. Mesmo com as mudanças sociais, muitas ainda carregam essa exigência interna de perfeição”, diz Galvão.

A maior carga, por exemplo, de tarefas domésticas realizadas por mulheres também se multiplica em lares chefiados por figuras femininas. Hoje, de acordo com dados do IBGE, mais de 50% dos lares brasileiros são comandados por mãe solo. “Essas mulheres precisam conciliar o sustento, o cuidado e a educação dos filhos, muitas vezes sem rede de apoio. É urgente discutir políticas públicas, como creches em tempo integral e jornadas de trabalho mais flexíveis”, defende a profissional.

Cuidar de quem cuida

Para Kalina Galvão, o apoio emocional é essencial pata quebrar o ciclo da sobrecarga. “Cuidar de uma mulher é cuidar de uma família inteira. Uma mãe equilibrada emocionalmente educa filhos mais empáticos e reduz comportamentos violentos. O autocuidado é, também, uma ação preventiva contra o adoecimento físico e social”, ressalta.

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Kalina Galvão, psicóloga.

Segundo dados recentes da Organização Mundial da Saúde, mulheres têm apresentado índices mais altos de ansiedade e de depressão do que os homens, o que é um reflexo direto dessa dupla ou até tripla jornada. Elas estudam, trabalham, cuidam, administram e, frequentemente, se cobram por não dar conta de tudo.

Ela ainda destaca que o pedido de ajuda não deve ser visto como um sinal de fraqueza. “A gente precisa derrubar o mito da supermulher. A maternidade saudável é a possível, não a perfeita. Se naquele dia não deu para preparar o jantar completo, mas deu para buscar o filho na escola e tomar um sorvete juntos, está tudo bem. Isso também é cuidado”, diz.

Kalina lembra que existem serviços gratuitos de acolhimento psicológico em policlínicas e parcerias com o Ministério Público. “Procurar um posto de saúde e pedir encaminhamento para atendimento psicológico é um passo importante. A prevenção começa com informação e com o reconhecimento das próprias necessidades”, reforça ela.

Embora a campanha Outubro Rosa concentre campanhas de conscientização, a psicóloga destaca que a saúde mental precisa ser uma pauta contínua. “Não se fala de equilíbrio emocional só em setembro amarelo ou janeiro branco. A vida acontece o ano inteiro e o cuidado também deve”.

Em tempos de redes sociais, onde tudo parece perfeito e leve, a psicóloga deixa um alerta. “A comparação constante é um dos maiores gatilhos de ansiedade. O que vemos nas telas é só um recorte, uma vitrine. O que importa mesmo é o que está dentro da caixa, o que ninguém vê. Por isso, precisamos de mais empatia e menos julgamento”, conclui Kalina.

O Outubro Rosa não é somente sobre exames e diagnósticos. É sobre dar espaço para respirar, dizer “não” sem culpa e pedir ajuda quando necessário, entender que o cuidado com o corpo começa na mente e que toda mulher merece esse tempo de pausa, de reconexão e de amor próprio.

Se você sente sinais de esgotamento emocional, ansiedade ou tristeza persistente, procure uma Unidade Básica de Saúde. Há atendimento psicológico gratuito mediante encaminhamento médico.


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