A cada grande mudança tecnológica, o mercado de trabalho passa por ondas de ansiedade, entusiasmo e disputa por novos significados. A Inteligência Artificial gerativa levou esse tensionamento ao limite, pois pela primeira vez uma tecnologia parece avançar diretamente sobre capacidades consideradas tipicamente humanas, como a escrita, a criação e o pensamento estratégico. No marketing, essa colisão entre expectativas e realidade produz um cenário que exige mais maturidade do que euforia, mais lucidez do que medo.
Philip Kotler alertou que o profissional de marketing do século XXI deveria dominar dados, tecnologia e comportamento humano ao mesmo tempo, e agora vemos essa previsão ganhar contornos definitivos e até dramáticos. A IA não substitui profissionais competentes, mas elimina rapidamente aqueles que insistem em operar no modo automático, presos a tarefas repetitivas que já não justificam tempo, equipe ou orçamento. A crítica de Shoshana Zuboff à automação massiva nos lembra que toda tecnologia amplia desigualdades quando não é acompanhada de qualificação, governança e ética. Esse é o ponto central da discussão que proponho esta semana.
O que observo, na prática do mercado brasileiro e piauiense, é uma mudança profunda na estrutura das equipes e das funções. Profissionais que dominam ferramentas de IA ampliam sua produtividade em níveis antes impensáveis. Uma pessoa pode fazer o trabalho de três, desde que saiba formular boas perguntas, estruturar processos, validar dados e garantir qualidade. O ganho é real, mas também cria uma pressão desigual, que favorece quem já tinha preparo e penaliza quem entrou atrasado na corrida da formação.
Por outro lado, a IA trouxe um fenômeno perigoso, especialmente entre jovens profissionais. A falsa sensação de competência. Acredita-se que basta digitar um comando para substituir anos de estudo, prática e repertório. A crítica de Daniel Dennett ao pensamento superficial se aplica perfeitamente ao nosso tempo. Ferramentas poderosas podem tornar pessoas mais fracas intelectualmente, quando usadas apenas como muletas para evitar o esforço cognitivo. O mercado percebe essa fragilidade, e ela cobra caro.
É preciso reconhecer também o aspecto econômico desse tensionamento. A automação de rotinas, o uso de assistentes inteligentes, a criação de peças, campanhas e análises com mais velocidade reduzem custos de produção e aumentam margens das empresas. Mas esse benefício também cria riscos, pois quando tudo fica mais rápido, espera-se que todos façam mais, o tempo todo. O profissional que não entender essa nova lógica será engolido pelo ritmo. O profissional que entender apenas essa lógica, sem cultivar profundidade, será descartável.
O que se impõe agora é um novo pacto profissional, baseado em três pilares que proponho aqui. O primeiro é a competência técnica. Não dominar IA em 2025 é equivalente a não dominar internet em 2005, simplesmente não é mais opcional. O segundo é a profundidade intelectual, ferrramentas não constroem reputação, pensamento crítico sim. O terceiro pilar é a ética,como lembra Luciano Floridi, toda inovação precisa respeitar limites humanos para ser realmente progresso. O uso irresponsável de IA em marketing pode manipular audiências, distorcer dados e fragilizar marcas. E claro, não existe futuro sólido construído sobre atalhos improvisados.
O tensionamento entre marketing, IA e trabalho continuará crescendo, não diminuindo. Mas quem enxerga a tecnologia como aliada, e não como substituta, já está um passo à frente. Esse novo mercado não quer apenas profissionais que sabem usar ferramentas, quer profissionais capazes de liderar tecnologia com visão, responsabilidade e criatividade. A IA não está tirando empregos, está tirando empregos ruins. Os bons continuam existindo, mas agora pertencem a quem decide ser melhor, todos os dias, do que a própria máquina.
Este é o momento de abandonar a ideia de ameaça e abraçar a ideia de evolução. Não há marketing forte sem profissionais fortes. E não há profissionais fortes sem preparo contínuo. O futuro já chegou, e está pedindo menos medo e mais disposição ao novo.
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