Na última semana, o artigo “É vergonhoso ter um namorado hoje em dia?”, publicado pela Vogue Britânica, levantou uma discussão intensa nas redes sociais ao sugerir que, para muitas mulheres, exibir ou assumir publicamente um namorado deixou de ser motivo de orgulho. A provocação, que discute como relacionamentos heterossexuais tradicionais deixaram de funcionar como “símbolos de status”, rapidamente virou tema nas redes sociais, com vídeos, memes e comentários variados.
Segundo o artigo, a antiga “terra dos namorados” (“Boyfriend Land”), em que a vida de uma mulher girava em torno de encontrar, ostentar ou manter um parceiro, está em processo de colapso. As razões apontadas vão desde o desejo de autonomia, até o receio de que um dia o casal termine e reste apenas a foto, o post, o histórico público. “Estar com um homem não afirma mais sua feminilidade”, escreveu a autora Chanté Joseph.
Nas redes, a reação variou entre curiosidade, crítica, ironia e identificação. No TikTok, a hashtag #EmbarrassingBoyfriend (Namorado Vergonhoso) apareceu em vários vídeos que satirizaram a ideia de “namorado como conquista”.
Comentários como “ter namorado passa a sensação de perder sua aura” ou “é mais um flex estar solteira” circulam entre vídeos em que o parceiro aparece apenas como sombra, braço ou bebida ao lado, nada de posts explícitos de casal.
Especialistas e observadores culturais apontam que o fenômeno é parte de uma mudança mais ampla no comportamento da geração mais jovem, pois há a tendência de a Geração Z valorizar cada vez mais a independência e a singularidade da trajetória pessoal e rejeitar relações que pareçam apenas simbólicas ou performativas.
Para muitas mulheres, se antes era símbolo social assumir um relacionamento nas redes, hoje pode ser sinônimo de desconforto. No artigo, uma entrevistada de 38 anos confessa que “Mesmo em romance, ainda sinto que homens te embaraçam — então assumir parece tão puxa-saco”.
Por outro lado, críticos argumentam que o pensamento de “ter namorado é vergonhoso” incorpora uma visão exagerada ou comercializada da vida amorosa. Um comentário editorial no jornal The Guardian observa que, embora a provocação seja legítima, há risco de se transformar em ditado e desprezar a variedade de relações saudáveis e conscientes.
Do ponto de vista da cultura digital, o episódio mostra como as redes sociais moldam não apenas o que mostramos, mas como nos sentimos sobre aquilo que mostramos. Uma mulher postar menos fotos com o parceiro não necessariamente significa que ele é vergonhoso, mas sim, talvez, que a própria lógica de visibilidade mudou. Hoje, viver uma vida em casal é menos valorizado pela maior parte da sociedade do que ter sua independência. Isso não significa viver para o namoro, mas, primeiramente, viver para si mesma.
Para o público brasileiro, a discussão também é relevante. Em um país onde a construção de identidade ainda está muito associada a papéis tradicionais, como casar, namorar, construir família, o artigo publicado na Vogue e a onda de debate nas redes trazem à tona reflexões sobre autonomia feminina, pressão social e o que de fato significa ter um relacionamento hoje.
Talvez, para muitas mulheres, a pergunta não seja “ter namorado é vergonhoso?”, mas sim “por que teria que ser um troféu?”. E, se a resposta for “não é”, talvez tenhamos chegado a uma virada cultural.
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